domingo, 7 de novembro de 2010

13º 14º Capítulo

13 - A Qualquer Momento

  - Mãe. - choraminguei.
  - O que aconteceu?
  - O Fábio... - e lhe contei toda a história enquanto íamos para o meu quarto.
  - Como... ?
  Eu já sabia qual pergunta ela ia fazer: Como ele foi capaz?
  - Também não sei. - respondi a sua pergunta inacabada.
  Ela, que já estava sofrendo bastante com a morte do meu pai, e eu aqui enchendo mais ainda sua cabeça de problemas. - Mas eu precisava dela.
  - Eu consegui encontrar alguns vídeos do seu pai! - Ela me entregou uma bolsa - Encontrei o os vídeos do trabalho voluntário que ele fazia para os hospitais de Seattle. Você vai gostar de ver.
  - Obrigada, mãe. Vai ajudar um pouco para tirar esses problemas da minha cabeça.
  - Tenho outra novidade.
  - Qual?
  - Sua irmã cansou de ficar no hospital fazendo tratamentos, e quer deixar a vida seguir seu rumo naturalmente. Todos da Fundação de Pesquisa da Progeria quiseram tirar isso da cabeça dela, mas decidi fazer a sua vontade. Ela quer passar seu aniversário de 14 anos aqui com você.
  - Giuliani vai vir para cá? Vai parar de ir ao médico?
  - Ela cansou de tomar remédios, nem estavam adiantando alguma coisa para a doença, então ela decidiu deixar a vida seguir a vontade dela. E ela quer passar o aniversário com a irmã que não vê há muitos meses.
  Giuliani tinha uma doença rara chamada progeria, ou envelhecimento rápido. Ela envelhecia sete anos em um, e sempre foi o meu xodó. A idade máxima para a vida de quem tinha essa doença, era 14 anos, então deve ser por isso que ela quer ficar aqui. - Lágrimas desceram no meu rosto - Ela poderia ter dias, semanas ou meses de vida.
  - Quando ela vai vir para cá? - Enxuguei meu rosto.
  - Daqui a alguns dias. O médico não quer que ela saia do país, mas prefiro fazer as vontades dela.
  - Sim. Faça isso! Ela não merece morrer em um hospital. - Ela não merece nem morrer.
  - É. Acha que pode ficar sozinha por algum tempo? Tenho que me instalar na casa.
  - Claro mãe. Por enquanto, vou ficar vendo os vídeos do pai.
  Ela me abraçou e foi para o outro quarto.
  Coloquei o DVD que minha mãe falou que eu ia gostar. Papai estava todo vestido de palhaço e contando a história da Chapeuzinho Vermelho para as crianças.
  "Pela estrada fora eu vou bem sozinha levar esses doces para a vovozinha." - Cantava a "palhaça" que fazia o papel de Chapeuzinho Vermelho.
  "O que fazes na floresta bela menina?" - Perguntou meu pai que era o lobo mau.
  "Vou levar essa cesta de doces para a minha vovó."
  "Mas por que vais pelo caminho mais curto? Não sabes que há lobos por aqui?"
  "Você é um deles e não tentou me machucar!"
  "Só por que sou bonzinho. Mas você está indo para o lado errado!" - Disse quando Chapeuzinho ia para o outro lado da sala - "Este lado é o mais curto. Você irá chegar mais rápido.”.
  E assim fiquei assistindo os vídeos até pegar no sono.

  Hoje era sábado, então não tenho que passar o sacrifício de ir gravar. Nesse momento eu decidi ser voluntária para as crianças no hospital. - Meu pai ia adorar de onde ele estiver me olhando.
  - Bom dia. - Eu disse a recepcionista.
  - Você é... ?
  - Sim. Alice Costa. Muito prazer.
  - O prazer é todo meu. O que deseja?
  - Aqui vocês tem trabalho voluntário para as crianças doentes?
  - Sim. Temos na enfermaria e para as crianças internadas.
  - Posso me candidatar?
  - Claro. Estamos precisando. O horário de visitas não começou, então já devem estar começando.
  - Já posso entrar?
  - Sim, as crianças vão adorar.
  - Qual é a sala?
  - Pode ir com os voluntários, eles vão te mostrar.
  - Obrigada.
  - Disponha.
  Encontrei com alguns voluntários à caminho da internação.
  - Olá. Eu me candidatei a voluntária.
  - Alice Costa! Meu nome é Vitória. É um prazer conhecê-la. - Disse uma mulher baixinha.
  - O prazer é todo meu.
  - Se vai participar, vai ter que colocar um nariz. - Ela colocou um nariz vermelho de palhaço em mim e uma peruca.
  - Fiquei bonita? - Brinquei.
  - Ficou perfeita para uma palhaça.
  - Que história vão contar?
  - Hoje cada um vai contar uma história sozinho. Sobrou a da Rapunzel para você. - Ela me entregou um livrinho.
  - Perfeito.
  Foi muito bom ver o sorriso das crianças enquanto contávamos as histórias. Eu contei a uma menina que se chamava Carolina. Tudo foi perfeito, até que uma pessoa que eu não esperava ver apareceu.
  - Fábio? O que você está fazendo aqui? - O puxei para fora da sala.
  - Belo nariz.
  Arranquei aquela coisa da minha cara.
  - Ainda não respondeu a minha pergunta.
  - A minha sobrinha está internada aqui, será que é errado fazer isso?
  - Claro que não! Você está entrando e eu estou saindo. Já terminei tudo o que tinha que fazer.
  Tentei ir embora, mas ele me segurou.
  - Quando vou poder conversar com você?
  - Nunca. Você tem idéia de quanto me magoou? Ah, você não sabe. Você nem pensou nisso quando aceitou aquela aposta estúpida.
  Ele me beijou por um momento, mas eu consegui me afastar.
  - Eu sei que cometi um erro, mas você sabe que me apaixonei por você, se ouviu a conversa inteira...
  - Eu ouvi! Mas isso não muda o fato de você ter feito aquilo comigo. Eu não teria coragem de fazer isso nem para o meu pior inimigo. Você foi capaz de fazer isso com uma pessoa que nem conhecia!
  - Acha que foi fácil para mim?
  - Se não foi fácil, por que não acabou com essa aposta? Se estava apaixonado por mim?
  - Por que se eu não cumprisse a aposta...
  - O que? Eles iam te matar? Qual motivo pode ser tão forte assim?
  - Aquela casa que eu moro, não é minha, é dos meus primos! Se eu furasse, eles iam me mandar para a rua.
  - Eles seriam capaz disso?
  - De coisa muito pior.
  - Bela família você tem!
  - Eles são a minha única família, o que queria que eu fizesse? Já não é difícil demais ficar sem pai nem mãe?
  Para essa pergunta eu não tinha resposta.
  - Foi o que pensei. - Ele me soltou - Agora que sabe dos meus motivos, espero que me odeie menos. Eu te amo! - E foi embora.
  Fiquei paralisada enquanto o via entrar na sala.
  - Você está bem Alice? Saiu da sala tão rápido - disse Vitória.
  - Estou bem. - Menti - Só tive uma conversa meio conturbada com um amigo. Vou para a casa.
  - Vai vir amanhã?
  - Todo o final de semana!
  Ela sorriu e eu fui embora.
  Tomei uma decisão um tanto correta. Fui até a casa do Fábio. Guilherme atendeu.
  - Oi. O Fábio não está aqui...
  - Não vim falar com ele. Vim falar com você. Posso entrar?
  Ele me levou até a cozinha e puxou a cadeira para eu me sentar.
  - Obrigada.
  - Então?
  - Vim falar sobre a aposta estúpida que fizeram!
  - Bem, nesse aspecto...
  - Como teve a coragem de apostar uma casa? Fazer seu próprio primo fazer uma coisa dessas para não perder a casa? O que vocês querem? Querem fazer um escândalo sobre eu e ele ou só são um bando de idiotas que adoram ver as pessoas sofrerem?
  - Vejo que ele te contou...
  - Responda!
  - Eu fiz essa aposta por que queria tirá-lo dessa casa, mas não funcionou.
  - Posso saber seus motivos?
  - Essa casa me pertence! A mim e a meu irmão Flávio!
  - E queriam tirá-lo daqui com uma aposta? Você só conseguiu magoar duas pessoas e não conseguiu a casa de volta. Se coloque no lugar do Fábio! Acha que gostaria de ser manipulado pelo próprio primo?
  Fui embora sem esperar pela resposta.
  - Alice. Oi. Se lembra de mim? - Perguntou um homem atrás de mim.
  - Não. Qual é o seu nome?
  - Eu sou o Mark! Nos conhecemos há 15 anos. Lembra?
  Ele era o homem por quem me apaixonei...
  - Mark! - O abracei - Como vai indo? Ainda está com a Reese? - Perguntei a voz uma oitava mais baixa por causa da lembrança.
  - Não! Nos separamos há cinco anos.
  - Seu filho?
  - Na verdade filha! Lana está enorme, 14 anos.
  - A mesma idade da minha filha.
  - Você tem uma filha? Mas...
  - Não, ela não é minha filha, literalmente. A adotei quando tinha 3 anos.
  - Ah. - Suspirou - Eu estranhei você era uma santa. Não namorava.
  - Continuo com isso até agora! Não gosto de me prender a uma pessoa só.
  Ele percebeu a tristeza na minha voz.
  - Você está bem?
  - Só estou passando por um momento difícil. Logo vai passar. - Isso era uma coisa que eu não posso saber.
  - Você parece bem triste.
  - Levo minhas emoções aos extremos. Uma característica terrível.
  Ele riu.
  - Pode rir. É um tanto engraçado mesmo. E aí? O que está fazendo por aqui? Seattle não é um lugar bom para você?
  - É um lugar ótimo, mas gosto de explorar outros lugares.
  - O Rio de Janeiro é um lugar ótimo.
  - Soube que está fazendo um filme. É verdade?
  - É. E essa é a causa da minha tristeza.
  - Por quê?
  - Não, esquece. Você pretende ficar aqui por muito tempo?
  - Não, estou indo embora amanhã, mas talvez eu volte quando tiver outra folga longa do trabalho.
  - Você trabalha em que?
  - Sou médico! Então quase não tenho folga.
  - Nem devia ter. - Brinquei - Bem, parece que vou te ver daqui a quinze anos mais uma vez, ou vou vê-lo um pouco antes?
  - Nem eu sei, mas talvez daqui um tempo. Talvez eu vá me transferir para um hospital daqui do Brasil. Quero voltar as origens.
  - Isso é bom. Isso é um tchau ou um adeus?
  - Um até logo seria melhor.
  - Então, até logo.
  Demos um longo abraço e ele foi embora.
  Bem... Isso não doeu tanto quanto achei que ia doer, foi um alívio diante das coisas que estão acontecendo comigo.
  Entrei no carro e fui para a casa.
  - Alice! Sua irmã decidiu chegar mais cedo! - Avisou mamãe.
  Giuliani, nos seus quase 14 anos, tinha a aparência, doenças e tudo de uma pessoa de 98 anos. Era careca - tentamos fazê-la usar uma peruca, mas ela não quis - Usava óculos por causa da hipermetropia. Tinha um metro e meio de altura mais ou menos.  Ela não envelhecera tanto quanto eu esperei. - Ela sorriu e eu fui abraçá-la.
  - Giuliani! Conseguiu dobrar sua mãe e vir para cá, não é?
  - Você sabe que eu consigo tudo. - Ela falava com dificuldade, mas eu já estava acostumada e conseguia entender.
  - Tem novidades? Arrumou algum namorado lá na fundação?
  - Ninguém me pareceu interessante. Mas estou disposta a dar uma chance a quem queira.
  Nós rimos.
  - Onde está a Emily? Eu trouxe uns presentes para ela!
  - Vocês duas já vão começar a fofocar, conheço vocês! Agora ela deve estar com o namorado dela, daqui a pouco ela chega. Enquanto isso, você não quer conhecer seu quarto? Eu reformei ele. Estava parecendo de uma criança, agora está mais apropriado a sua idade.
  - Eu quero. Vou enchê-lo com os meus pôsteres. Minha coleção está ficando cada vez maior.
  - Por isso deixei uma parede com uma tela onde você pode colocá-los, com imã, por que você não gosta de colá-los, não é?
  - Isso mesmo. Não gosto de colar, por que depois se eu quiser tirá-los, eu não vou conseguir.
  - Então vamos. - A peguei no colo e minha mãe levou a cadeira.
  Ela pesava menos de trinta quilos, mesmo que devorasse tudo o que ela mais gostava.
  Eu era apaixonada pela minha irmãzinha, e morria de medo dela morrer, mesmo sabendo que isso pode acontecer a qualquer momento.

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